É difícil a vida de quem confunde gripe com crise existencial.
Eu andava me sentindo bem, na verdade eu estava acima da média dos últimos tempos: minha taxa de alegria basal, enterrada no 6 por um bom tempo, passou para 7 e eu estava quase considerando um 7,5. Mas então, na segunda-feira de manhã, após um final de semana especialmente agradável, comecei a tossir, espirrar, lacrimejar. Pronto. Fundiu meu sistema respiratório, fundi eu. Minha atual satisfação existencial (sempre meio desajuizada e irracional, já que não tem como se sentir satisfeito nesta espelunca de sociedade) despencou, comecei a questionar escolhas que eu não questionava havia tempos, desisti subitamente de esperanças recém-conquistadas. Minha vida passava em flashes pela minha cabeça, voltei a rezar.
Dizem que nós, mulheres, somos mais fortes quando ficamos doentes. Meu Instagram me humilha com memes de homens que, gripados, acham que vão morrer. Pois hoje comecei a passar a limpo minhas senhas todas para o meu marido e organizar a papelada para o caso de eu não estar mais aqui. Ele insistiu que ainda não havia chegado a minha hora, mas eu estava convencida de que meu estado era grave e ele estava em negação. Me encolhi no sofá e, tremendo, pedi o termômetro. 37,3 graus.
Ele perguntou se eu queria ir ao médico, eu só balbuciava: não sei... não sei... Marcamos uma tele-consulta. A médica me perguntou se eu estava com febre, depois se eu estava perdendo o ar, depois alguma coisa que eu nem me lembro: só sei que todas as minhas respostas foram “não” e ela me receitou Allegra, Dipirona, soro fisiológico e repouso.
O soro e o repouso, ela nem precisava ter indicado. Desde segunda de manhã, eu estava me arrastando pela casa, agarrada no meu frasco de soro e me poupando das tarefas mínimas. Expliquei que mamãe estava muito doente. Ricardo levou e buscou o Vi na escola e se incumbiu de preparar as refeições todas, porque, como sempre acontece nessas horas, a nossa funcionária também ficou doente e não vem desde segunda (eu peguei dela ou ela pegou de mim, não sabemos). Contei que estou menstruada faz uns dez dias? A minha sensação era de que eu estava colapsando.
Na terça-feira, assim que se passaram 24 horas dos primeiros sintomas, fiz o teste de COVID: negativo. Achei que o teste estava errado, peguei meu cobertor e me mandei para o quarto, onde tive calafrios tenebrosos. Cada onda de calafrio era uma pergunta sobre a vida. Fiquei três horas deitada, sem dormir e sem celular. Veio uma sequência de culpas: a culpa de ter ficado doente era minha, eu que não tomei vacina contra a gripe este ano, eu que não ando me alimentando direito, estou comendo poucas frutas, castanhas, ovo, muito pão, pão, pão.
Hoje acordei pior do que ontem, mas ganhei alguma confiança após a consulta médica.
Na minha nova oração, peço: se eu ficar boa, vou voltar a tomar suco verde. Vou voltar a comer ovo no café da manhã. Pelo menos duas frutas por dia.
Peço a todos da casa que tenham paciência comigo, me arrasto numa reunião online, passo a tarde dormindo. Mais flashes da minha vida passam a toda pela minha cabeça. Me pergunto quem eu sou, por que estou aqui, para onde vou.
Toda vez é isso. Por que a gripe me deixa assim? Por que eu faço esse drama?
Não é drama.
pelo menos você não jogou os sintomas no google. seria ainda mais terrível!
Desejo melhoras!!