Atravessada pelo excesso de tecnologias digitais sim, mas com limites. Por exemplo: me recuso a me sentar na privada e fazer o número 2 com o celular na mão.
No início dos 90, quando usava o banheiro na casa de uma tia, ficava admirada com o cesto de vime recheado com revistas variadas ao lado do vaso sanitário. Por um lado, aquilo me parecia um cuidado com quem gosta de se entreter nessas horas. Por outro, me parecia apenas meio bizarro. Aquele era um momento de silêncio, introspecção e tédio, simplesmente. Indo um pouco mais além, era um momento de conexão com o meu corpo, embora eu não pensasse nisso.
Mas, em termos de estímulos, o cesto de revistas, coitado, não é nada perto de um celular.
Isso de levar o celular para o banheiro e ficar vendo vídeos e trocando mensagens num dos momentos mais íntimos e, com perdão do trocadilho, mais privativos do mundo dito civilizado... A gente precisa mesmo se ocupar o tempo todo? Se informar o tempo todo? Não dá mesmo para ficar quieto? Ou quem sabe prestar um pouco de atenção ao nosso empenhado intestino, que está ali solitário, dando o melhor de si?
Eu sei que é comum, que geral se entretém com o celular enquanto está sentado na privada, mas a gente realmente precisa de tanto entretenimento, meu Deus? Por que eu usaria meu momento de meditação fisiológica, sim, meditação fisiológica, para, digamos, assistir um corte do debate da Kamala X Trump ou fazer um PIX?
É sério que essa é uma boa hora para se descontrolar rindo com um meme? Ou para mandar uma mensagem para a chefia? Um “eu te amo” para o namorado? Comprar uma blusinha na Shein? De verdade?
Outro dia eu soube de um suporte para celular para ficar assistindo alguma coisa enquanto se toma banho. Não basta se entreter enquanto está sentado na privada, é preciso se entreter quando se está no banho.
E fechar os olhos, levantar os braços e ficar apenas sentindo a água? O que dizer das boas ideias sob o chuveiro? A simpática cantoria enquanto se ensaboa o corpo? Os pensamentos soltos, as risadas e as lembranças do nada e meio sem cabimento, aquele momento de eu-comigo que às vezes, na correria do dia, já é tão difícil conquistar?
Bem, chega de desabafo, cada um com suas escolhas.
Eu ainda prefiro preservar alguns momentos de solidão, e não me venha dizer que dá para ter um momento de solidão com o celular na mão. E alguns desses momentos precisam ser no banheiro. Até porque, em dias agitados, é no banheiro o refúgio possível.
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Minha casa, meu jeitinho: não levo celular nem pra cama, nem pro banheiro. Pra mesas às vezes acontece.
Essa Newsletter me tirou sinceras risadas! hahahahaha