Quando o assunto é educação dos filhos, muito se fala sobre a importância de não mimar demais as crianças. Principalmente quando você pega um educador muito focado no público das classes sociais AB, antevendo os privilegiados sem noção no futuro. Educadores e pais com algum bom senso fazem coro: não dá pra fazer todas as vontades da criança, quem ama educa, dá limites, fala “não” e coisa e tal.
Claro, não tenho como discordar. Aliás, rápido e impressionante caso sobre pais que não falam “não” para os filhos: há muitos anos, no shopping Ibirapuera, minha então cunhada presenciou um menino de uns seis anos jogando PIPOCA nas pessoas do andar de baixo. Ele estava com a mãe, que mexia no celular e não dizia nada. Um segurança do shopping passou e pediu para a mãe, timidamente, segundo a minha cunhada, para que o garoto parasse de fazer aquilo. A mãe ficou superbrava… Com o segurança. Quando este saiu, ela ainda virou para a minha cunhada e falou: “Pode? O segurança vindo encher meu saco?”. Ao fundo, o menino ainda atirando a pipoca. Minha cunhada respondeu que concordava com o segurança e a mulher, antes de pegar o filho pela mão e sair dali, ainda bateu boca com a minha cunhada.
Suspiros. Eu sei, é um caso terrível. Não acho que esse menino da pipoca esteja condenado a nada, mas é difícil imaginá-lo se transformando num adulto que respeite a faixa de pedestre.
(E antes que você me critique por estar criticando uma mãe e não falando nada sobre o pai, faço esse parênteses exclusivamente para criticar o pai que nem conheço, mas que naminha imaginação é babaca).
MAS, apesar da enrolação para chegar até este parágrafo, não é sobre isso que vou falar aqui.
Muito se fala sobre pais que não dão limites aos seus filhos, mas, na minha opinião, pouco se fala sobre pais que criticam DEMAIS os filhos. E é o que mais vejo.
Pai implicando para o menino tirar a blusa de frio sendo que ele quer ficar com a bendita blusa, mãe falando para o filho que não pode gostar disso ou daquilo. Parece pouco, mas, quando você vê, esse tipo de pai ou mãe está falando O DIA INTEIRO para a filha que ela não deve gargalhar desse ou daquele jeito, que ela está falando muito alto, que o cabelo dela está feio, que ela não senta direito. Não é assim que faz, não é assim que fala, não é assim que dança, não é assim que se pensa. O filho não está falando que nem homem, está muito magro, está com a cara muito desanimada, precisa botar o boné para a frente, se interessar mais por esportes, parar de ver tanto esse desenho. A filha não deve se vestir desse jeito, não pode cortar o cabelo com esse corte, o filho não deve fazer esse comentário, não pode sair com essa camiseta.
O Joseph Campbell tem uma frase que eu amo e já mencionei aqui: quem cresce num ambiente muito rígido, cheio de regras, dificilmente chega ao conhecimento de si mesmo.
Tem pais que querem que os filhos sejam miniaturas de si mesmos, e não pessoas autônomas, com o próprio jeito de ser, de pensar. Quando se chama a atenção da criança ou do adolescente o tempo todo… Acho que essa vai ter muito mais trabalho para gostar de si mesma ao longo da vida.
Se para falar de política basta ser cidadão, para falar de educação de filhos basta… Se interessar pelo assunto, nem precisa ter filho. Me interesso demais pelo assunto, tenho meus filhos e a conclusão de algumas das minhas reflexões é que eles deve ser poupados de críticas desnecessárias. Principalmente filha mulher, porque já vão pegar muito no pé dela sociedade afora. Com filha mulher é ainda mais urgente segurar a onda nas críticas.
Não tenho medo (nem um pouco) de falar não para a Valen, mas sempre procurei deixar minhas correções mais no campo do óbvio. Quando ela tinha três anos, eu dizia coisas como: sem bater no coleguinha, não pode botar o dedo na tomada, não pode lamber a pedra do chão, não pode jogar pipoca nos outros! De resto, até descabelada deixava ela sair de casa, se ela não queria pentear o cabelo. Deixa ela.
Ela foi crescendo e o óbvio foi se complexificando, mas me recuso a ser aquela mãe que fica só criticando a geração dela, dizendo coisas como “Como você pode gostar dessa música?”. Aliás, nessa fase da pré-adolescência, acho que pesar nas críticas só afasta o filho da gente.
“Deixa ela”: já falei bastante isso quando notava que alguém estava falando para ela, às vezes com a melhor das intenções, algo em que não vejo a menor importância. Por exemplo, o modo como ela usa as unhas ou a gíria que usa. Quer falar que do seu jeito é melhor? Exponha seu pensamento sem corrigir, e, se ela não concordar, deve ser respeitada.
Dar limites é necessário, mas acho que pegar no pé por qualquer coisinha não tem nada a ver com dar limite, é chato e prejudicial.
Claro que o mais grave que os pais podem fazer com os filhos é não amá-los. Porque ser muito mimado ou corrigido o tempo todo não faz bem a ninguém, mas não ter sido amado na infância me parece a questão mais difícil para alguém lidar vida afora.
Eu não entendo esse policiamento de roupa/ cabelo/ gosto em cima de criança, especialmente de crianças pequenas. São tantas as batalhas quando criamos filhos que me parece um contrassenso escolher essas, até em termos de praticidade mesmo. Concordo com você, que amadurecimento terrível a pessoa vai ter se esforçando para caber na expectativa dos pais, para todo tipo de coisa.
Não sou mãe, mas achei incrível e concordo. É preciso lembrar que a criança é outro ser e não uma extensão dos pais.