Me mantendo meio em dia
Então X e boomers e millennials precisam copiar a geração Z e os alfa? Chega dessa humilhação
Tenho alguns amigos mais novos que eu e, na maior parte do tempo, a gente nem se lembra disso, mas é como dizem, o diabo mora nos detalhes.
Outro dia uma amiga quinze anos mais nova foi rir numa conversa nossa pelo WhatsApp e, em vez de escrever um kkk ou mandar um emoji de risada chorando, ela botou uma caveira. Coincidentemente, eu tinha lido uns dias antes que os millennials e a genZ têm gostado de usar emoji de caveira quando acham alguma coisa engraçada – significa: “hahah que engraçado, morri”. Fiquei na dúvida: respondo também com uma caveira? Mantenho meu emoji de risada chorando (que agora parece que é cringe?). Ou libero geral e respondo com um emoji de cadeira, que está bombando entre os mais novos, segundo matéria do UOL?
Que humilhação o passar do tempo nos impõe, amigos. Como sofrem aqueles que, como eu, tentam se manter meio em dia.
Como se já não bastasse conferir no Spotify a lista das bandas que tocaram no último Lollapalooza e não reconhecer nenhuma, como se já não bastasse ver a lista dos ganhadores do prêmio Nickelodeon e não saber quem é quem.
Respondi a caveira da minha amiga com o emoji de risada aberta, que, ao que parece, continua neutro. Me senti bem. Queria mandar emoji chorando de rir, porém fiz uma pequena concessão ao novo, porém não a ponto de querer ser de outra geração. Não sou de outra geração. Nem quero ser. Só quero me manter meio em dia, sabe.
Nunca amei essa fixação em diferenças geracionais que o Brasil importou dos Estados Unidos. Boomer, geração X, Y, Z – óbvio que cada um de nós tem algumas características que são mais presentes em sua geração, mas botar a questão geracional no centro das análises sobre comportamento, cultura, mídia cansa um pouco, não? Até porque as pessoas muito típicas, de modo geral, são sem graça – o paulistano típico, a esposa típica, o marido típico, a escorpiana típica... bocejos. Deus me livre ser alguém típica da minha geração (que descobri há alguns anos que se chama xenial, entre X e millennial). Aqui e ali sou padrão, aqui e ali sou surpresa, mistério, singularidade assumida.
Mesmo assim, quero me manter meio em dia. Saber como as gerações mais novas tem feito as coisas, mesmo se eu for continuar fazendo do meu jeito. Ver o mundo de hoje sem arregalar os olhos a todo momento, ouvir sem desejar ser surda - é pedir muito? Não, não quero ficar presa na maneira que sempre fiz, obrigada. Fazer as coisas de um modo congelado no tempo, sem me abrir às novidades e ainda por cima ficar reclamando que antigamente que era bom – não é isso o envelhecer, no mau sentido da palavra? Não, não. Quero o envelhecer apenas no sentido inevitável.
Pois então. Guiada por essa saudável disposição para reciclar meus hábitos e modos de ver as coisas, de vez em quando infelizmente erro a mão e caio no ridículo fazendo coisas como: tentar rir com emoji de caveira. Uma pena, para uma alminha bem-intencionada como a minha. Em minha defesa, tenho uma filha de 14 anos que toda hora fica esfregando na minha cara que isso aqui já era, que aquilo ali é que é demais. Não sou da turma dela, inclusive Deus me livre passar horas no TikTok, pulando meu café da manhã ou montando lookinho para ir à academia, mas de vez em quando me bate a vontade de ficar por dentro, sabe? De chamar meus fios rebeldes da frente do cabelo de “baby hair”, de não achar as músicas da Billie Eilish enjoadas, de ver um filme inteiro pelo celular porque, puxa vida, quem disse que a TV enorme da sala é a melhor opção?
Momentos depois de receber a caveira da minha amiga, tentei emplacar uma caveira pelo WhatsApp com meu marido. Assim que ele me mandou um meme, nem vi direito o que era e já fui enviando uma caveira pra ele. Sabe quando o emoji fica sozinho na frase e vira um emojizão? Pois é, cliquei na caveira e foi uma caveirona. Ele não comentou nada. Instantes depois, ele me mandou outra coisa engraçada, dessa vez pelo Insta, e mandei outra caveira. Como ele não comentou nada e eu estava ansiosa para saber o resultado da aplicação da minha neogramática emojisística, bati na porta do escritório dele:
– Tá muito ocupado? Pode me responder uma coisa?
– Claro, amor, diga.
– Você notou que eu estou rindo com caveiras hoje?
– Hã?
– No Whats e no Insta, mandei emoji de caveira em vez de rir. O pessoal tem usado.
– Sério? Achei mesmo meio estranho, mas não falei nada. Respeitei, né.
– É caveira porque é “morri de rir”, li acho que no UOL.
– Ah, bom saber.
"Bom saber”: sei não. De bom saber em bom saber, acho que estou acumulando um monte de saberes inúteis. De vez em quando, não saber é a melhor coisa que tem. Não saber que eu não sei, mas não agir como se eu soubesse: não saber em paz. Ah, que coisa boa.
Acho que esse negócio de querer acompanhar alguns hábitos das gerações mais novas surgiu na minha vida quando eu mesma era muito jovem e estava no colégio. Lembro que vi uma mulher de uns 50 anos usando uma sobrancelha bem fininha, um risquinho mesmo, numa época em que sobrancelha bonita era a da Ana Paula Arósio, Malu Mader. Comecei a reparar que várias mulheres mais velhas usavam aquela sobrancelha fininha e fui perguntar para minha mãe por que elas usavam a sobrancelha daquele jeito.
– É porque na época delas era moda – minha mãe respondeu.
– Mas não é moda hoje. Hoje, sobrancelha assim envelhece, fica estranho.
– Mas era bonito naquela época e elas não se atualizaram...
Do alto dos meus 15 anos de idade e com tempo para ficar incomodada com o estilo de sobrancelha dos outros, decretei: vou sempre acompanhar a moda!
Corta para eu com 44 anos, uma mulher com muito menos tempo e disposição para acompanhar a moda do que quando eu era mais nova, mas que gosta de se manter meio em dia com as coisas de modo geral, porque sim, o mundo anda cada vez mais diferente daquele em que nasci e cresci, mas continua me interessando, até porque por enquanto só tem este mundo mesmo e preciso me virar com este aqui, e porque não quero me congelar em referências antigas, até porque sempre tem alguma coisa nova interessante surgindo, me surpreendendo, me afetando. Sempre tem uma besteira nova também, claro, um absurdo novo, uma nova idiotice total, mas enfim, este texto está se encaminhando para o fim e não quero terminá-lo nesta toada.
Embora felizmente, na minha terceira tentativa de emplacar um emoji de caveira, eu tenha decidido tirá-lo da categoria das coisas novas interessantes surgindo. Pode me chamar de velha: emoji de caveira é só mais uma modinha dos Z e dos Millennials que já me dão preguiça pelo simples fato de eu escrever “entre os Z e os Millennials”. Chega de humilhação! Tenho meus limites, assim como minha fome pelo novo.
Dane-se também o tal emoji de cadeira.
E, pensando bem, não reparei como estão usando as sobrancelhas hoje, mas não pretendo mudar as minhas.
Eu queria saber o significado do emoji de cadeira hahaha
💀